Por MIRO CEQUINEL
Vivenciamos uma época
de mudanças nos comportamentos sociais de consumo. Os avanços tecnológicos têm
causado forte impacto sobre as mais diversas áreas do conhecimento e das
relações humanas. A internet, o celular e a televisão se tornaram ferramentas e/ou
canais de vendas de produtos, bens e serviços, e em 2013 foram responsáveis por
um faturamento de R$ 28 bilhões conforme o e-bit, uma das principais fontes de
informação desse segmento – e usada muitas vezes em palestras e eventos
recentes do mercado segurador, mas que ainda
não computa dados do mercado de seguros. E a tendência indiscutível é que
esse comércio continue a crescer, pois no Brasil, dos quase 200 milhões de
habitantes, cerca de 107 milhões acessam a internet e 51 milhões já realizaram
alguma compra por este canal.
Muitos segmentos já
realizam hoje vendas por meios não presenciais, em especial os de moda e acessórios,
eletrodomésticos, cosméticos, informática e livros/revistas, de maneira que
começamos a ter a necessidade de legislação e regulação atualizadas (grande
parte da legislação sobre o tema havia sido elaborado nos anos 90), que se
adaptem a essa realidade.
Em março de 2013, foi
publicado pela Presidência da Republica, o Decreto nº 7.962, que regulamenta a
lei nº 8.079 de 11 de Setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no
comércio eletrônico. Este marco regulatório institui, entre outros pontos, que
o consumidor deve ter acesso a informações claras sobre o produto, serviço e
fornecedor, atendimento facilitado e seu direito de arrependimento assegurado.
Existem ainda outros projetos de Lei tramitando no Senado sobre o assunto, como
o Projeto de Lei do Senado nº 439/11 e o 281/2012 (que podem ter continuidade,
ou não, pois muitas vezes o seu proponente pode não ter tido o mandato renovado,
e o projeto pode morrer no labirinto legislativo, que envolve comissões e
subcomissões criadas para discutir os temas, audiências públicas, consultas a
entidades, etc.) .
No mercado de seguros,
da mesma forma que o governo da Índia, através do IRDA (Insurance Regulatory
and Developmente Authority) veio a publicar em 2011 uma legislação federal
amparando a compra de apólices de forma desmaterializada, no Brasil, após
debate promovido pela Susep para colher subsidio para o marco regulatório, em
Setembro de 2013, foi publicada também a Resolução do CNSP (Conselho Nacional
de Seguros Privados) 294/2013,
regulamentando a utilização de meios remotos nas operações de seguros e de Previdência
Complementar Aberta. A resolução define meios remotos como aqueles que permitam
a troca e/ou acesso à informação e/ou todo tipo de redes de comunicação
envolvendo o uso de tecnologias como a rede mundial de computadores, telefonia
(telemarketing, SMS), televisão a cabo ou digital, sistemas de comunicação por
Satélite. Diferentemente da legislação indiana, que parece entender os meios
remotos como uma ferramenta, a legislação brasileira, parece entendê-lo como um
novo canal de venda.
Porém o principal objetivo
da resolução 294 é resguardar o direito do consumidor, regulando a prática pela
venda desmaterializada, estabelecendo que as operações de seguros, realizadas
através de meios remotos devem garantir alguns preceitos básicos como:
1) A comprovação da autoria e integridade de documentos contratuais
encaminhados pela sociedade.
2) A identificação do contratante, assegurando a autenticidade, a
confidencialidade e a integridade de seus dados.
3) A segurança na troca de dados e informações com o contratante e,
quando couber, com o corretor, no envio de senhas e procedimentos envolvendo
solicitações de cancelamentos e alterações das condições contratuais.
4) A confirmação do recebimento de documentos e mensagens enviadas pela sociedade ao contratante ou, quando couber, ao corretor.
4) A confirmação do recebimento de documentos e mensagens enviadas pela sociedade ao contratante ou, quando couber, ao corretor.
5) O fornecimento de protocolo ao contratante, em qualquer operação de
envio, troca de informações e/ou transferência de dados e documentos.
6) A possibilidade de impressão do documento e se o contratante
solicitar, fornecer a sua versão física.
Como já vem sendo realizado na
emissão de apólices negociadas pelos meios tradicionais (contratos estes já
emitidos em sua maioria eletronicamente), a emissão de apólices e certificados
individuais devem seguir as normas da ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves
Públicas Brasileiras) ou outra autoridade Certificadora Raiz.
De maneira a assegurar
a identidade do usuário da mídia eletrônica (proponente do seguro), porem de
forma flexibilizada, além do uso de certificação digital, a formalização da
proposta de contratação pode ser feita através de Login e senha, ou
identificação biométrica. Ou seja, o entendimento do órgão regulador é que a
assinatura digital através de Certificação Individual ICP deve ser utilizada
obrigatoriamente apenas pela seguradora (apenas em uma das pontas), podendo no
caso do usuário, esta identificação ser substituída por um Login e Senha. Entendendo
que a seguradora é a emissora da apólice, e que somente ela é obrigada a
assinar digitalmente o contrato firmado, aqui começamos uma inversão do que
vemos historicamente na venda tradicional, onde o cliente é o “Proponente” do
contrato de seguros, e o mesmo se origina com a emissão da proposta.
A sociedade deve
fornecer ao segurado, com a utilização de meios remotos, os protocolos
obrigatórios previstos na legislação. Como por exemplo o protocolo que atesta o
recebimento do aviso de sinistro, de envio de documentos de contratação, e de
envio de informações.
A Susep teve ter garantido o acesso à todos os documentos através de Login e senha, sendo que de maneira bastante similar o regulador indiano solicita o mesmo em sua legislação de 2011.
A Susep teve ter garantido o acesso à todos os documentos através de Login e senha, sendo que de maneira bastante similar o regulador indiano solicita o mesmo em sua legislação de 2011.
Para as operações de planos de previdência complementar aberta e de seguro de vida com cobertura por sobrevivência sejam válidas, deverá ser feito o registro prévio no Sistema de Registro Eletrônico de Produtos – REP da SUSEP e disponibilizar ao proponente, previamente, o regulamento de tais produtos.
A Resolução também reforça sobre o
direito de arrependimento, que já era assegurado aos contratantes pelo Código
de Defesa do Consumidor: o contratante poderá desistir do contrato no prazo de
7 (sete) dias corridos a contar da data da formalização da proposta. Ao exercer
o direito de arrependimento, os valores eventualmente pagos, a qualquer título,
serão devolvidos de imediato, respeitado o meio de pagamento utilizado pelo
cliente, sem prejuízo de outros meios disponibilizados pela seguradora e expressamente
aceitos pelo segurado.
Apesar da legislação se destinar a
diversos meios de venda remota, o que vemos é que a mesma no Brasil foi em
grande parte pensada na venda pela Internet (diferente da legislação Indiana
que quando analisada deixa claro que foi pensada centrando a venda por
telefone/ call center). Ocorre que grande parte das vendas realizadas por meio
remoto hoje no Brasil, assim como na Índia, ainda são realizadas por telefone,
ou até mesmo através de SMS (Serviço de Mensagens Curtas) - meios que enfrentam
grande dificuldade em atender a nova legislação brasileira, que foi pensada
pelos reguladores visando a Internet.
Após a leitura da Resolução, no que
tange aos corretores de seguros, fica a impressão de que o regulador brasileiro pensou nesses meios como um canal
independente de venda ao consumidor, possivelmente sem grande participação, ou
até mesmo sem ser uma iniciativa direta do corretor de seguros (que pouco é
mencionado na resolução), porem a venda on-line no mercado brasileiro teve
início pelo meio da corretagem (e da criação de diversas corretoras de seguros
“startups1” constituídas especialmente para a venda on-line) e
certamente esses novos meios continuarão a ser usados pelo corretor de seguros
para oferecer produtos aos seus clientes.
Como a comercialização de seguros é
consultiva (e muitas vezes uma venda relacional), ainda está distante o dia em
que a figura do corretor será excluída da comercialização de seguros. Porem, será
necessário que o corretor de seguros se adapte às exigências do novo
consumidor, se integrando cada vez mais às novas tecnologias, uso de novas
ferramentas e seus avanços. No mercado brasileiro, os meios remotos tendem a se
estabelecer, não como mais um canal de distribuição, e sim mais como uma
ferramenta, com a função de facilitar o acesso de mais pessoas à necessária
proteção do seguro.
Valdemiro Cequinel Belli -Corretor de seguros e sócio da Cequinel Cor. Adm. Seguros, formado em Economia e em Processamento de Dados, possui especialização em Estratégias de Vendas (MBA), é professor da Escola Nacional de Seguros, nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul.